segunda-feira, 18 de novembro de 2013

2014 o ano que já começou

2014 O ANO QUE JÁ COMEÇOU
Rui Patterson, advogado
ruipatterson@terra.com.br
2014. Cinquenta  anos do golpe militar de 64. Tema pouco ou nada discutido na sala de aula da educação básica, à exceção de iniciativas individuais de docentes, tem ficado para as universidades o cumprimento deste “dever de casa”.
Potencializando iniciativas individuais, nossos estudantes do ensino médio recebem da Secretaria da Educação do Estado da Bahia o projeto Ditadura Militar Direito à Memória – 50 Anos do Golpe Militar de 64. Ao toque de uma tecla no portal da secretaria, valioso e único material sobre o período - fora dos círculos concêntricos do sul-sudeste -, para auxiliar nos seus estudos. Bem diferente de 2004 quando dos 40 anos do golpe, a rede pública da educação básica manteve silêncio reverencial sobre o tema, enquanto a sociedade organizada ecoava o mantra: ditadura nunca mais.  
1964. Na calada da noite de 31 de março, setores militares associados ao empresariado e parte da mídia unem-se aos Estados Unidos e golpeiam a democracia brasileira. O presidente João Goulart é deposto. Universidades, sindicatos, todos os espaços santuários de democracia e representação popular são ocupados pela força das armas. A juventude, os trabalhadores, o clero, a imprensa são indistintamente acuados, açoitados, presos, torturados. Parlamentares comprometidos com os anseios do povo são cassados. Servidores, de ministros a contínuos, perdem seus cargos. Casas são invadidas, famílias desrespeitadas, no sistema “caça às bruxas” norte-americano que executou, sem provas, o casal Ethel e Julius Rosemberg. O arbítrio institucionaliza-se seguindo a cartilha do tudo para a matriz e seus aliados internacionais.
1964 a 1985. Longo período de arbítrio. A sociedade inicia, timidamente, a reação, contando com a poderosa ajuda do clero progressista e dos trabalhadores, a partir dos sindicatos. Os “anos de chumbo” recrudescem e vencem mais uma vez a democracia, instalando o golpe dentro do golpe, sob a face cruel do AI-5, de dezembro de 1968, eliminando os resquícios de liberdades, inclusive o direito de habeas corpus. Sem alternativas, a juventude resiste, empurra a sociedade para o novo, exigindo mudanças. Em 1979, a lei da anistia esvazia as prisões e inicia o retorno dos exilados começando nos aeroportos a reconstrução da democracia. A ditadura sai pela porta dos fundos enquanto o país começa a retomar o Estado democrático de direito.
1985 a 2013. Vieram Sarney com sua inflação de quase três dígitos, Collor e as maracutaias nos palácios e nos jardins da Casa da Dinda. A resistência firme da juventude colorida de caras pintadas, expondo orgulhosamente os rostos – sem máscaras -, depõe o primeiro presidente eleito pós-64, suas gravatas e bravatas. Fernando Henrique Cardoso, doutor-sociólogo, de colarinho branco, com a propaganda de garantir novos destinos ao país, elege-se presidente por quatro anos. Manobrando a maioria do Congresso Nacional, de acordo com denúncias exaustivamente divulgadas pela imprensa, ficou oito. Depois Luís Inácio, o Lula, sertanejo e operário, a partir da criação do verdadeiro trabalhismo, enfrentou a elite e sua ridícula ameaça de abandonar o país se governado por quem não tinha diploma universitário. Lula se elege incluindo cerca de 40 milhões de pessoas à sociedade de consumo. Dilma, primeira mulher e guerreira assumida, é elevada ao maior cargo da República e continua o processo de inclusão social. Austera, demite ministros e outros tantos, correspondendo à confiança que a nação lhe deposita. São tempos de severa recessão causada pela banca internacional atingindo todos os países. A sociedade, sem colarinho branco, permanece unida na defesa da sua presidente.
A geração que enfrentou à ditadura de cara limpa e dispensou máscaras quando fazia sentido usá-las, está viva. Muitos se foram na tortura, “desaparecidos” após suas prisões, outros ainda sofrem por sequelas da violência a que foram submetidos nos centros de tortura, lembranças do terror extremo que ainda interrompem o sono. Nós sobreviventes continuamos fazendo história, marcando presença no “chão da escola” da educação básica. Cinquenta anos depois.
Publicado no jornal A TARDE, Bahia, 09/11/2013.

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